No sexo não existem idades, só inquietações que ultrapassam gerações…
O meu avô, um homem diferente na sua época, que escolheu sempre caminhos alternativos para levar a vida com uma ingenuidade e uma vivacidade ímpares. Com ele aprendi quase tudo, a ser um amante do sexo feminino, a respeitar o meu semelhante, e talvez um dos maiores segredos sobre as mulheres. Disse-mo uma vez à saída da cozinha, e nunca mais me esqueci: “Coloca sempre a mulher no seu lugar, o mais alto possível, ama-a, fá-la feliz e nunca te terás de preocupar com a tua roupa...”
Sempre teve uma visão não convencional relativamente às coisas tradicionais e, embora se fizesse pautar pelo respeito e pela educação mútua, fez sempre questão de levar tudo na brincadeira e com um sorriso na cara. As visitas regulares ao médico eram recheadas de histórias e quando apareceu no mercado o famoso Viagra, foi dos primeiros a comprar. Ouvi-o bastantes vezes dizer que as mulheres devem ser conquistadas dia após a dia, sem nunca esquecer os mimos, o carinho e o perdão. Talvez seja por isso que sempre se orgulhou de nunca ter tido uma discussão com a minha avó.
Mas de todos, talvez tenha sido eu o neto que mais se aproximou do meu avô. Passava as tardes lá em casa onde aprendi a saborear a sensualidade da sua voz, a apreciar a sabedoria com que esfregava lentamente as mãos, e quase todos os piropos que dava às senhoras. O ar pórtico e altivo, de chapéu à antiga, conferia-lhe o tal charme perdido nos dias de hoje. E se por acaso o acompanhava a algum lado, não eram raras as vezes em que levava a mão ao chapéu quando cruzava com uma senhora de mais idade. Quem sabe, sabe… e foram estes truques que o fizeram conquistar a mulher da sua vida. E ao que parece não foi fácil! Das mais pretendidas do seu tempo, uma beleza inigualável e um desejo superior que exigia arte e mestria na dura conquista. A mesma que utilizou durante a vida na manutenção de um casamento inabalável e na educação dos filhos e netos.
Um dia apareci lá em casa com uma amiga que era modelo numa agência internacional. Apanhei-o discretamente a olhar para o decote exagerado da rapariga com um olhar experiente de quem aprecia um bom “espécimen”. No dia seguinte pediu-me que me sentasse junto a ele. Lembro-me como se fosse hoje, passei pelo escritório, trouxe-lhe uma cigarrilha da sua caixa de madeira, e sentei-me na ponta do sofá para ficar bem junto à sua poltrona. Perguntei-lhe o que queria e ele, com gestos sábios, acendeu calmamente a sua cigarrilha, deu o primeiro trago, expirou o fumo e olhava persistentemente em frente. Esperei que todo aquele ritual terminasse, curioso pelo raspanete que iria apanhar. Que teria eu feito desta vez? Depois da sala estar já conspurcada de ambiente masculino trazido pelo fumo, manteve o seu olhar num ponto fixo em frente e disse num tom suave e baixo: “-Sebastião... queres contar ao teu avô a tua relação com aquela “jovem” que ontem me apresentaste?” Não me consegui conter e soltei uma gargalhada que me fez estender ao comprido no sofá. “-Ó avô! Agora deu em preocupar-se com as minhas relações?” O meu avô mantinha o seu semblante sério embora tivesse já esboçado um pequeno sorriso. E continuou a sua argumentação: “-Não achas que me devo preocupar quando vejo o meu neto com uma mulher daquelas?” Na altura continuei a minha gargalhada e a conversa desviou-se para outros caminhos.
Mais tarde apercebi-me que a preocupação que o meu avô expressara naquela altura era tão e somente se eu tomava as devidas “precauções”. E percebi no dia em que fui com ele à farmácia do bairro para comprar uns medicamentos e ele diz: “-E já agora traga uma caixa daquelas coisas para o rapaz que já se anda a portar mal...” O farmacêutico, senhor de bastante idade, sorriu para mim como se eu fosse um garoto. Naquele momento senti-me com 6 anos encostado ao balcão da mercearia, de boné na cabeça, à espera do chocolate de morango. Deve ter sido das maiores vergonhas que apanhei, mas talvez das maiores lições em meios contraceptivos. A partir desse dia percebi que pode-se gastar milhões em campanhas publicitárias, mas enquanto não sentirmos vergonha de não usar, nunca iremos aprender...
O meu avô morreu esta semana e embora tenha deixado a família de luto, em mim deixou-me uma alegria enorme de ter compartilhado comigo os seus maiores segredos, incluindo a sua sexualidade e os mais antigos ensinamentos. Não chorei uma lágrima, mas sorrio muitas vezes quando me lembro da desanda que dava às empregadas quando traziam os namorados militares até à porta de casa para se despedirem. Dizia sempre e em voz alta para todas ouvirem: “-Podem fazer as asneiras todas da porta para fora... mas depois não se queixem quando já não passarem nela...” Elas baixavam a cabeça em sinal de vergonha e ele, se por acaso eu estava à espreita, piscava-me o olho em jeito de marotice. E recordo com saudade o jantar em que contou que um dia, em que foi ao sótão buscar uns caixotes, apanhou o meu primo com 16 anos a vasculhar umas revistas pornográficas já antigas provavelmente dos meus tios. O meu primo, temeroso pela atitude do avô, pediu-lhe para que não contasse nada a ninguém. O meu avô não aceitou assim de bandeja o contrato e propôs-lhe segredo em troca de decorar uns textos da dita revista. Dias depois sujeitou o pobre rapaz a declamar os “nobres diálogos” por mais de uma hora...
Hoje recordei os momentos que passei com ele e que mais sentido fazem neste “sex in lisbon”, mas não me posso esquecer das suas preocupações em não me ver nos últimos tempos ao lado de alguém que realmente me amasse. Podemos estar rodeados de gente, mulheres lindas e fabulosas, e mesmo assim não ter quem realmente nos aconchegue a alma. E se nestas alturas deveria esperar que ele “descanse em paz”, não creio que o vá fazer e talvez por isso desejo um “divirta-se muito” para todos aqueles que, como ele, passam a vida inquietados com o misterioso e admirável mundo das mulheres...