Na vida do homem, o amor é uma coisa à parte, na da mulher é toda a vida…
“-Achas normal? Tu achas normal fazeres-me isto?”
“-Desculpa... não precisas de ficar assim...”
“-Não preciso de ficar assim? Tu estás a gozar comigo Sebastião?”
“-Não… tem calma...”
“-Tenho calma? Tu não deves é ser bom da cabeça...”
A Mariana ligou-me no dia a seguir como se nada fosse. Não dei importância ao caso e fingi mesmo que nada tinha acontecido. Pediu-me desculpa por ter-se atirado a mim e pediu-me segredo relativamente a toda a gente! Acho natural e o interesse também é meu pois se não aconteceu nada (pelo menos de significativo) então que não se fale de nada. E depois para ela é muito pior do que para mim porque eu não tenho nenhuma namorada… muito menos surfista! Fizemos um pouco mais de conversa banal e pronto. Ficou resolvido.
Entretanto recebi uma mensagem da Catarina que me fez lembrar, uma vez mais, o amor que existiu entre nós. Foi uma relação de quatro anos que pareceram quarenta! Não pelo cansaço de um amor de quarenta anos, mas pela intimidade e cumplicidade que sempre nos uniu. Vivemos intensamente os nossos tempos de namoro, éramos apaixonados e gozávamos ao máximo a companhia um do outro. É verdade que por vezes desligávamo-nos do mundo exterior... mas é normal nos primeiros tempos de casal apaixonado! Se tínhamos tanto para conhecer, e se estávamos bem, e se queríamos estar juntos, porque havíamos de fazer fretes e andar por aí só por andar? Acho que conduzimos bem a nossa relação e, embora tenhamos acabado, nunca nos queixámos do facto de algum de nós ter abandonado as amizades como costumo ver acontecer com certos amigos.
Recordo uma vez que fomos até Madrid, num daqueles fins-de-semana de Carnaval ou Páscoa, e que se transformou numa lua-de-mel. A Catarina é uma miúda doce e sabia bem controlar as situações. Aproveitava quase sempre o facto de estarmos bem para alimentar o espírito… a maior parte das raparigas consegue fazer exactamente o contrário, aproveita as melhores alturas para fazer birras e mais birras. Nisso, ela era exemplar. Às vezes, quando ouço certas músicas mais lamechas, recordo as vezes que dormimos juntos, sei quase todas de cor, os locais, as posições, os risos e os sisos, e até mesmo as roupas e os cortes de cabelo. Foi uma paixão grande, e mútua! Não tenho razão de queixa e tenho mesmo de admitir que durante estes tempos fui bastante feliz ao lado dela… até um dia.
Num dia quente de Julho tinha acabado de chegar da praia e a Catarina ligou-me a dizer que precisava de falar comigo. Não tive dúvidas que íamos acabar, a minha dúvida era porquê! Ela escudou-se no telefone e foi incapaz de mo dizer cara a cara. É normal... Nos meses que se seguiram, cada vez que estávamos juntos, dormíamos. Ela nunca conseguiu resistir quando o encontro era pessoal. Já o mesmo não acontecia quando se tratava de conversas telefónicas, ela fugia, conduzia, lutava, baralhava, trocava e manipulava as conversas. Irritei-me várias vezes, penso que levantei a voz uma ou duas vezes, provavelmente para dizer basta! E nesse dia que levantei a voz, mesmo sem razão aparente, acabou-se! O grande problema estava no facto de eu estar demasiado apaixonado por ela e de não conseguir viver com o facto de estar a “dormir a prazo” com uma pessoa que entretanto já não tinha mais uma relação assumida comigo. Eu sei que gosto de amizades coloridas, mas não gosto de ser amizade colorida de ninguém. É diferente... Essas relações funcionam agora entre mim e a Filipa porque estamos ambos no mesmo pé, nenhum de nós está apaixonado pelo outro, ambos somos descomprometidos e guardamos um respeito mútuo sem nunca produzirmos amor ou paixão. É como um jogo, onde a aposta máxima é o respeito e o carinho, e é proibido qualquer um se viciar. Assim que tal acontecer é expulso da mesa.
Com a Catarina era não era assim, eu estava apaixonado e ela conseguia ir mantendo relações sexuais comigo. Mas eu precisava de mais... e decidi parar. Foi uma escolha difícil que ainda hoje está no limiar do que é aceitável e do que eu realmente preciso. Hoje continuo a gostar dela exactamente da mesma forma, mas tento conformar-me com o facto de haver alguém de quem goste e que não tem o mesmo sentimento que eu. Ou não...
Cheguei das aulas e encontro a Catarina à porta de casa. Fiquei feliz, já não estava com ela há imenso tempo e fiquei contente por vê-la bonita como sempre. Cabelo arranjado e preso em rabo-de-cavalo, calças da moda e uma camisola grossa de lã que lhe dava um ar quentinho. Convidei-a para entrar e perguntei-lhe o que de tão importante haveria para estar à porta de minha casa à espera. “-Podias ter ligado, eu tinha faltado à última aula para não ficares à espera...” Nem me respondeu. Não sei o que se passa mas esta situação deixa-me desconfortável. A Catarina nem posou a mala na mesa da entrada e assim que volto da casa de banho pergunta-me num tom calmo e doce: “-Sebastião, quem é a Rita?” Não sabia o que dizer… “-A Rita? Qual Rita? Conheço tantas Rita’s…” Mas ela não se deixou enganar: “-Não te armes em parvo! A Mariana contou-me tudo, encontrei-a na Católica e contou-me que andavas a namorar a Rita…” Se tivesse um buraco igual ao do Saddam acho que me metia lá dentro e nem os americanos me tiravam! A Catarina faz uma cara que é um misto de tristeza com raiva e eu não sei o que dizer... afinal ela não é minha namorada e eu estou aqui a justificar-me. Porquê? E aquela Mariana? Não sabe estar calada?
A Catarina continuava a discutir e fazia perguntas que eu nem respondia direito. A dada altura saiu porta fora e eu fiquei sentado no sofá a olhar para aquele teatro.
Vá lá um homem entender as mulheres...