Faz aos outros tudo aquilo que desejarias que fizessem contigo...
Hoje fiz questão de me redimir da noite com a Filipa e fui buscar a Rita a casa para almoçarmos como combinado. Demorei uma boa meia hora a dar novamente com a rua mas lá cheguei. As minhas pernas tremiam, e o meu coração pulava... é horrível esta sensação de arrependimento. A empregada abriu-me a porta esboçando-se em mil sorrisos que eu não consegui retribuir coerentemente por me sentir culpado. A Rita estava a acabar de tomar banho (a esta hora? Não foi trabalhar?) e eu fui simpaticamente conduzido à sala para aguardar pela “menina”. Entrei na sala e quando me preparava para sentar num dos sofás já antigos ouço a voz da Rita gritar ao cimo das escadas: “- Sebastião, sobe!” (E o que foi feito do querido?). Subi e senti-me que nem Maria Antonieta a ser levado para o cadafalso. Pequeno aparte: os homens são tão fortes para umas coisas... e para outras!!! (frase feita, deve pagar direitos de autor...) Retomemos, pois.
O quarto dela é enorme e foi difícil depois de um beijo seco (na cara...) sentir-me minimamente à vontade na trincheira do inimigo. Enquanto penteava o seu cabelo comprido na casa de banho da suite, perguntava com um ar desinteressado o que eu tinha feito. Decidi virar o jogo e assumir o papel de vítima. São poucos os trunfos que ainda me restam... “-Quando as mulheres me abandonam e vão para os montes no Alentejo costumo aproveitar e ler uns quantos romances melodramáticos para animar...” A Rita não gostou da brincadeira e ainda com a escova presa no cabelo e o secador na mão em riste olhou para mim e perguntou-me num tom baixo mas agressivo: “Tu estás a gozar comigo não estás? E esses livros também incluem filmes com amigas ou é só depois de irem para a cama?” Ups... de repente quem viu o filme todo fui eu, na segunda-feira antes de vir para casa com a Filipa passámos no Blockbuster para entregar um filme e alugamos outro, e logo por azar encontrei a Mariana com o parvalhão do namorado surfista que entretanto deve ter contado tudo a esta. Calma Sebastião, ela não te vai bater... ou será que vai?
Desapareceu do meu ângulo de vista mas mesmo assim decidi continuar a falar calmamente: “-Ás vezes até incluem, e normalmente até é depois de ir às Amoreiras comprar um presente para as meninas...” Vi a sua cabeça espreitar por entre a porta com um ar de admirada pelo que tinha ouvido quando lhe mostrei o presente que trazia no casaco. A Rita ficou admirada que eu tivesse comprado um presente e esboçou um sorriso enquanto se dirigia a mim. Abriu e não esperou um segundo para desembrulhar o perfume que comprei a correr no El Corte Inglês antes de ir ter com ela e tratou logo de experimentar no pulso. “- É óptimo! Obrigada querido... e desculpa ter desconfiado de ti.” Senti-me um rato, mas salvo. Enquanto a ajudava a vestir o casaco explicou-me que nem tinha ido trabalhar porque estava triste com o que a Mariana lhe tinha contado sobre mim. Descemos e a empregada voltou a sorrir-me vendo o ar de felicidade da “menina”. Agora percebi que a Rita me considera definitivamente seu namorado. Antigamente era necessário pedirmos em namoro, falar em namoro, pedir a mão aos pais, sair, jantar, conversar, ser apresentado à família... agora pelos vistos basta uns “scones com chá” e um “chop suey a três” para estar-se entalado à séria.
Fomos almoçar ao Bairro Alto (lá se vai o Visa...) e durante a refeição parecia que estávamos a festejar sabe-se lá o quê. A Rita tem um sorriso lindo e o seu riso de tão espontâneo conquista qualquer um com a sua timidez natural. Uma mistura de menina e mulher cada vez mais difícil de caracterizar, mas muito interessante. Passámos a tarde em tantos beijos que quase me esqueci da cena à moda da Lapa.
Deixei-a no atelier ali para os lados do Príncipe Real e voltei para casa. Nem sinal da Filipa... e só quase em cima da hora de jantar é que a ouvi entrar em casa. Não sei se já tem luz mas, pelo sim pelo não, decidi desligar a campainha e deitei-me no sofá a reflectir o meu dia de hoje.
Nada do que fiz gostaria que fizessem comigo, mas preferia que me omitissem aquilo que me iria magoar, que me contassem a verdade. Foi só por isso que o fiz...