O meu computador é hoje tão importante como foi a roda há 6000 anos…
Hoje sinto-me um triste produto da minha sociedade. A Rita acabou de me enviar uma mensagem a perguntar se eu achava normal termos discutido por causa de um computador. Será que ela não percebe que “o meu computador” não é “um computador”?
Há algum tempo que me rendi aos computadores portáteis, são a máquina de escrever com que sempre sonhei em criança com a vantagem de ter aparecido no meu tempo. Devia ter uns 14 anos quando se dá o "boom" dos computadores pessoais e a minha adolescência foi passada entre jogos e o tão desejado Word. Mais tarde tive o meu computador mas ainda dividindo com a restante família. Quando adquiri a independência decidi comprar o meu computador e carregá-lo para todo o lado. É impensável alguma vez vir a ter uma torre com um monitor enorme, eu e o meu portátil somos um só e tudo o que eu penso está lá.
Ontem estava a escrever um e-mail quando o computador se desliga sem razão aparente. Voltei a ligar quando me apercebo que tinha apanhado um vírus... Eu tenho programas antivírus, tenho "firewall" e mesmo assim o vírus entrou. Procurei na pasta dos meus documentos e estava vazia! Entrei em colapso... não queria acreditar no que estava a ver, todos os dados que estavam guardados tinham-se perdido! Fiquei desolado mas como tinha uma cópia de segurança feita há um mês tratei de aproveitar alguns dados.
Esta operação demorou um bocado (5 horas...) pois estava entretido a ver algumas coisas que nem sabia que existiam. E a verdade é que o tempo passa a correr e sem darmos por isso quando estou empenhadamente a computar! A Rita liga-me e enquanto falava ao telefone com ela, estava a ler um e-mail muito antigo de um flirt… claro que as minhas respostas se baseavam em: “-sim…. pois… o quê… não percebi…” Na minha opinião é normal! Que eu saiba ainda não é proibido computar e estar ao telefone ao mesmo tempo... ou é? A Rita ficou chateada e desligou o telefone com um simples “-Depois liga…” As horas foram passando e é incrível aquilo que acabei por descobrir naquele CD. Eu tenho cartas de amor há 6 anos guardadas e no meu sentido de economia pensei em como as poderia reaproveitar. Aliás, lembrei-me daquela célebre frase “Está tudo dito no amor… não há mais nada a dizer”, e como não sou um um abrupto do sexo, achei que seria importante guardar estas pérolas para mais tarde fazer uma reciclagem aos nomes e reutilizar aquelas doces palavras.
Quando terminei era quase meia-noite e decidi ligar à Rita. Atendeu-me contente com imenso barulho por trás. Detesto quando estou a falar com alguém e está imenso barulho e mesmo assim insistem em continuar... não dá para sair? O único sitio que penso ser impossível de sair é num avião e aí os telefones não podem ser usados! Ela, a muito custo, lá se afastou da música e quando já era aceitável conversar perguntei-lhe onde estava. “-Vim com uns amigos até ao bairro...”. Questionei-lhe porque não me disse nada ao que ela replicou mais uma vez: “Tu não me ligavas nenhuma... eras só tu e o teu computador”. Não acho que essa seja uma desculpa, lá por estar ocupado com o meu computador nada a impede de ligar a dizer que vai dar uma volta e convidar-me para ir junto. Ou será que ela não queria que eu fosse? Perguntei-lhe. E ela respondeu: “-Se eu te convidasse tu não vinhas...” A partir deste momento sei que qualquer conversa com uma mulher é mais que motivo para uma discussão e assumi toda a calma e desejei que se divertisse. Sem ironia... mas com uma natural raiva interior.
Mais tarde ligou-me com a certeza que o caminho da discussão não seria o melhor, no entanto as suas ideias mantinham-se obtusas e em nada alteravam. Tentei alterar a então inevitável rota de colisão e pedi-lhe desculpa por não ter tomado a devida atenção, mas seria isso motivo para ela virar-me as costas em jeito de traição? Eu sabia que ela estaria algures à porta de um bar a pensar em mim e a olhar de minuto a minuto para o telemóvel à espera de mensagem, mas então porque o fez? Porque não veio ter comigo se era atenção o que ela mais precisava? Quando a questionei sentiu-se pressionada pela verdade e, qual criança a fugir à verdade, decidiu desligar-me o telefone na cara. Não gosto que o façam mas decidi não fazer nada. Há mulheres que percebem a igualdade nas palavras, e outras não... A vantagem de serem tratadas por iguais é que podem expressar os seus sentimentos com a mesma equidade. Passados dez minutos recebo esta mensagem: “Desculpa ter desligado o telefone mas achas normal termos discutido por causa de um computador? Gosto muito de ti, beijinhos querido...” Decidi-me pelas tréguas e não por perder tempo a explicar-lhe uma vez mais que não foi por causa de um computador, mas por algo muito mais complexo e difícil de alterar: a sua atitude. Até porque o meu computador é meu, e ela?